sexta-feira, 26 de junho de 2009

Poesia concretista

Maria acordou cedo bebeu um copo de leite foi pra academia fez ginástica voltou pra casa tomou banho tomou café escovou os dentes arrumou o quarto lavou o banheiro varreu a sala foi no shopping comprou vinho comprou a janta comprou um cd novo comprou um vestido passou na floricultura comprou um buquê de tulipas escreveu uma dedicatória no cartão mandou entregar á noite foi ao salão fez o cabelo fez as unhas voltou pra casa tomou banho pediu uma pizza comeu escovou os dentes dormiu sonhou acordou ligou o som pôs o cd novo preparou a janta tomou outro banho pôs o vestido novo pôs o vinho na taça pôs a janta no prato jantou ouviu a campainha tocar atendeu recebeu o buquê de tulipas leu o cartão: Feliz Aniversário!

Victor Az



A Formiguinha Feliz

Todos os dias a Formiga produtiva e feliz chegava ao escritório. Ali transcorria os seus dias, trabalhando e cantarolando uma velha canção de amor.
Era produtiva e feliz, mas não era supervisionada. O Marimbondo, gerente geral, considerou o fato impossível e criou um cargo de supervisor, no qual colocaram uma Barata com muita experiência.
A primeira preocupação da Barata foi a de padronizar o horário de entrada e saída, além de preparar belíssimos relatórios.
Bem depressa se fez necessária uma secretaria para ajudar a preparar os relatórios e, portanto, empregaram uma aranhazinha, que organizou os arquivos e se ocupou do telefone. Em quanto isso, a formiga produtiva e feliz trabalhava e trabalhava.
O Marimbondo, gerente geral, estava encantado com os relatórios da Barata, e terminou por pedir também quadros comparativos e gráficos, indicadores de gestão e analise das tendências. Foi, então, necessário empregar uma Mosca ajudante do supervisor, e foi preciso um novo computador com impressora colorida.
Logo a Formiga produtiva e feliz parou de cantarolar as suas melodias e começou a lamentar-se de toda aquela movimentação de papeis que tinha de ser feita.
O Marimbondo, gerente geral, concluiu, portanto, que era o momento de adotar medidas: criaram a posição de gestor da área onde a Formiga produtiva e feliz trabalhava.
O cargo foi dado a uma Cigarra, que mandou colocar carpete no seu escritório e comprar uma cadeira especial. A nova gestora de área - claro - precisou de um computador novo, e quando se tem mais do que um computador, a Internet se faz necessária. A nova gestora logo precisou de um assistente (sua assistente na empresa anterior) para ajuda-la a preparar o plano estratégico e o orçamento para a área onde trabalhava a Formiga produtiva e feliz.
A Formiga já não cantarolava mais, e cada dia se tornava mais irascível. "Precisaremos pagar para que seja feito um estudo sobre o ambiente de trabalho um dia desses", disse a Cigarra. Mas um dia, o gerente geral - ao rever as cifras - se deu conta de que a unidade na qual a Formiga produtiva e feliz trabalhava não rendia muito mais.
E assim contratou a Coruja, consultora prestigiada, para que fizesse um diagnostico da situação.
A Coruja permaneceu três meses nos escritórios e emitiu um relatório brilhante com vários volumes e custo de "vários" milhões, que concluía:
"Ha muita gente nesta empresa".
E assim, o gerente geral seguiu o conselho da consultora e demitiu a Formiga, por que andava muito desmotivada e aborrecida...

Moral:Antes de julgar ,devemos examinar o contexto.

Projeto NURC

Objetivo
O Projeto de Estudo da Norma Lingüística Urbana Culta (Projeto NURC) tinha inicialmente o objetivo de documentar e descrever a norma objetiva do português culto falado em cinco capitais brasileiras: Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife. A partir de 1985, considerando as novas tendências de análise lingüística, ampliou-se o escopo do projeto, no sentido de abraçar outros aspectos, tais como: análise da conversação, análise da narrativa, análise sócio-pragmática do discurso e outros.

O que é gramática normativa?

gramática normativa a gramática que busca ditar, ou prescrever, as regras gramaticais de uma língua, posicionando as suas prescrições como a única forma correta de realização da língua, categorizando as outras formas possíveis como erradas.

O que é gramática descritiva?

A gramática descritiva é uma gramática que se propõe a descrever as regras de como uma língua é realmente falada, a despeito do que a gramática normativa prescreve como "correto". É a gramática que norteia o trabalho dos linguistas que pretendem descrever a língua tal como é falada.

Sonho de Deus

Querem calar o poeta
Que canta a libertação
Que resgata a memória
De resistência à escravidão.

Querem silenciar os atabaques
A dança da negra gente,
Que na força do Axé
Sonha um Brasil diferente.

Querem emudecer nosso grito
De denúncia e indignação
Contra o sistema corrupto
Que gera miséria e opressão.

Mas o sonho, a dança e o canto,
Calados não serão,
Pois é sonho de Olorum,
O Deus da Libertação!

Arlekson Barreto Ramos

receita para arrancar poemas presos:

você pode arrancar poemas com pinças

buchas vegetais. óleos medicinais

com as pontas dos dedos. com as unhas

com banhos de imersão

com o pente. com uma agulha

com pomada basilicão

alicate de cutículas

massagens e hidratação

mas não use bisturi nunca

em caso de poemas difíceis use a dança.

a dança é uma forma de amolecer os poemas

endurecidos do corpo.

uma forma de soltá-los

das dobras dos dedos dos pés. das vértebras

dos punhos. das axilas. do quadril

são os poema cóccix. os poema virilha

os poema olho. os poema peito

os poema sexo. os poema cílio

ultimamente ando gostando de pensamento chão

pensamento chão é poema que nasce do pé

é poema de pé no chão

poema de pé no chão é poema de gente normal

gente simples

gente de espírito santo

eu venho do espírito santo

eu sou do espírito santo

traga a vitória do espírito santo

santo é um espírito capaz de operar milagres

sobre si mesmo


Viviane Mosé

domingo, 7 de junho de 2009

(Sem título)

Terrorismo com torresmo,

Represália a alho e óleo,

Militante à milanesa,

E tortilha de guerrilha.


Ciranda, cirandinho,

Vamos todos cirandar,

Vamos dar a meia volta,

Volta e meia vamos dar.


Molho pardo de massacre de combate,

Passeata com cassata de mandato,

Gabinetes com tortura ao molho tártaro,

Putsch com ketchup, croquetes de seqüestro.


Salada mista extremista com vinho de Greves,

Trincheiras trinchadas com ilegumes partidos,

Regimes e Dietas à la Magna Carta.

Magna

Che te fa fene!


Valentim, tim, tim,

Valentim, meu bem,

Quem tiver inveja

Faça assim também.

Soneto 26 - Lírico

Dizem que o amor é cego e a carne é fraca,

mas só amei alguém quando enxergava.

Hoje a cegueira queima como lava

e o coração resiste a qualquer faca.


Ontem tesão, agora ressaca.

Foi-se a paixão que fez minh'alma escrava.

Se inda me queixo dessa zica brava,

sou caçoado e passo por babaca.


Nem tudo está perdido: resta o cheiro

que invade-me as narinas quando passo

na porta do vizinho sapateiro.


Vá lá: o papel que faço é de palhaço.

O olfato é meu recurso derradeiro

e o cheiro do fetiche o único laço.

Glauco Mattoso

Governamental

Tamanho nepotismo se constata

nos quadros do governo, que, bem breve,

nenhum parente vivo fora deve

ficar da mordomia e da mamata!


o genro, a nora, a sogra mais ingrata,

cunhados e sobrinhos, quem se atreve

a demiti-los, mesmo quando em greve

declaram-se ou trabalham sem gravata?


Nenhum apaniguado que se preza

aceita cargo abaixo de chefia,

cartilha em que a família toda reza.


Se alguém a falcatrua denuncia,

chamado é de "invejoso", pois lhe pesa

a culpa de ocupar vaga da tia.

Glauco Mattoso

LICENCIOSO

Poetas têm licença p'ra mudar
até certos preceitos de gramática.
Alteram nomes, fatos, pondo em prática
um próprio e onipotente linguajar.

A tal liberação vem compensar
limitações de molde e de temática.
Porém a liberdade democrática
não passa do direito de pensar.

Agora, o que me intriga é a incoerência
daqueles que defendem o poeta
mas negam-lhe o prazer da preferência.

Condenam minha tara predileta,
a cega devoção ao pé, tendência
poupada se for "hétero" e discreta.

Glauco Mattoso

Define a Sua Cidade





De dois ff se compõe

esta cidade a meu ver:

um furtar, outro foder.







Recopilou-se o direito,

e quem o recopilou

com dous ff o explicou

por estar feito, e bem feito:

por bem digesto, e colheito

só com dous ff o expõe,

e assim quem os olhos põe

no trato, que aqui se encerra,

há de dizer que esta terra

de dous ff se compõe.





Se de dous ff composta

está a nossa Bahia,

errada a ortografia,

a grande dano está posta:

eu quero fazer aposta

e quero um tostão perder,

que isso a há de perverter,

se o furtar e o foder bem

não são os ff que tem

esta cidade ao meu ver.





Provo a conjetura já,

prontamente como um brinco:

Bahia tem letras cinco

que são B-A-H-I-A:

logo ninguém me dirá

que dous ff chega a ter,

pois nenhum contém sequer,

salvo se em boa verdade

são os ff da cidade

um furtar, outro foder.

Gregório de Matos

Finge que Defende a Honra da Cidade e Aponto os Vícios de Seus Moradores





Uma cidade tão nobre,

uma gente tão honrada

veja-se um dia louvada

desde o mais rico ao mais pobre:

cada pessoa o seu cobre,

mas se o diabo me atiça,

que indo a fazer-lhe justiça

algum saia a justiçar,

não me poderão negar

que por direito, e por Lei

esta é a justiça, que manda El-Rei





O Fidalgo de solar

se dá por envergonhado

de um tostão pedir prestado

para o ventre sustentar:

diz que antes o quer furtar

por manter a negra honra,

que passar pela desonra

de que lhe neguem talvez;

mas se o virdes nas galés

com honras de Vice-Rei,

esta é a justiça, que manda El-Rei





A Donzela embiocada

mal trajada, e mal comida,

antes quer na sua vida

ter saia, que ser honrada:

à pública amancebada

por manter a negra honrinha,

e se lho sabe a vizinha

e lho ouve a clerezia,

dão com ela na enxovia

e paga a pena da lei:

esta é a justiça, que manda El-Rei.





A Casada com adorno,

e o Marido mal vestido,

crede que este tal Marido

penteia monho de corno:

se disser pelo contorno

que se sofre a Frei Tomás

por manter a honra o faz,

esperai pela pancada,

que com carocha pintada

de Angola há de ser Visrei:

esta é a justiça, que manda El-Rei.





Os Letrados Peralvilhos

citando o mesmo Doutor

a fazer de réu o Autor

comem de ambos os carrinhos:

se se diz pelos corrilhos

sua prevaricação,

a desculpa, que lhe dão,

é a honra de seus parentes

e entonces os requerentes

fogem desta infame grei:

esta é a justiça, que manda El-Rei.





O Clérigo julgador,

que as causas julga sem pejo,

não reparando que eu vejo

que erra a Lei, e erra o Doutor:

quando vêem de Monsenhor

a sentença revogada

por saber que foi comprada

pelo jimbo, ou pelo abraço,

responde o Juiz madraço,

minha honra é minha Lei:

esta é a justiça, que manda El-Rei.



O Mercador avarento,

quando a sua compra estende,

no que compra, e no que vende,

tira duzentos por cento:

não é ele tão jumento,

que não saiba que em Lisboa

se lhe há de dar na gamboa;

mas comido já o dinheiro

diz que a honra está primeiro,

e que honrado a toda Lei:

esta é justiça, que manda El-Rei.





A Viúva autorizada,

que não possui um vintém,

porque o Marido de bem

deixou a casa empenhada:

ali vai a fradalhada,

qual formiga em correição,

dizendo que à casa vão

manter a honra da casa;

se a virdes arder em brasa,

que ardeu a honra entendei:

esta é a justiça, que manda El-Rei.





O Adônis da manhã,

o Cupido em todo dia,

que anda correndo a coxia

com recadinhos da Irmã:

e se lhe cortam a lã,

diz que anda naquele andar

por a honra conservar

bem tratado, e bem vestido,

eu o verei tão despido,

que até as costas lhe verei:

esta é a justiça, que manda El-Rei.





Se virdes um Dom Abade

sobre o púlpito cioso,

não lhe chameis religioso,

chamai-lhe embora de frade:

e se o tal paternidade

rouba as rendas do convento

para acudir ao sustento

da puta, como da peita,

com que livra da suspeita

do Geral, do Viso-Rei:

esta é a justiça, que manda El-Rei.

Gregório de Matos

Poema a um estudante.

Mancebo sem dinheiro, bom barrete,

Medíocre o vestido, bom sapato,

Meias velhas, calção de esfola-gato,

Cabelo penteado, bom topete.

Presumir de dançar, contar falsete,

Jogo de fidalguia, bom barato,

Tirar falsídia ao moço do seu trato,

Furtar a carne à ama que promete.

A putinha aldeã achada em feira,

Eterno murmurar de alheias famas,

Soneto infame, sátira elegante.

Cartinhas de trocado para a Freira,

Comer boi, ser Quixote com as Damas,

Pouco estudo, isto é ser estudante.

Gregório de Matos